Operárias da guerra

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Fotografias: Acervo do Office of War Information da Biblioteca do Congresso Americano.

Curadoria: Georgia Quintas.

Local: Madalena Centro de Estudos da Imagem, São Paulo entre 04/03/2013 ~ 12/05/2013.

Fotos: Alexandre Belém

Operárias da guerra – Razões e encenações

Por Georgia Quintas

Além do olhar, além da imagem, a história de um arquivo fotográfico cria camadas que deslizam-se ao longo dos anos, em direção a questionamentos. E mais, nos coloca diante da possibilidade de perceber como um documento iconográfico é vívido ao aclarar sobre dada sociedade, dada contingência econômica e cultural de uma época relevante.

As fotografias desta exposição foram realizadas durante a Segunda Guerra Mundial sob a demanda do Office of War Information (1942-1945), órgão governamental dos Estados Unidos criado com o objetivo de chancelar a propaganda para arregimentar mão de obra feminina para a indústria bélica. Hoje, o acervo está guardado na Biblioteca do Congresso Americano. Ao colocar a fotografia à serviço da propaganda – e a propaganda à serviço de uma ideologia bélica-econômica-industrial – a imagem que nasce dessa cadeia é em certa medida a categorização de um modelo de discurso. De um status icônico no qual a aura delicada feminina se contrapõe ao serviço mecânico, árduo; porém, realizado com a precisão das mãos da mulher.

O inventário criado a partir de uma demanda propagandística é também uma compilação de intenções. A imagem da mulher representada é um elemento de construção de significados para aquela conjuntura social e econômica. Desse modo, o papel da mulher que antes “servia” apenas à casa, filhos e marido, era subvertido e legitimado pelo governo. Não há nas imagens o teor etnográfico, de registrar características, situações subjetivas ou índices de investigação. Há, entretanto, a trabalhadora-modelo que posa, que espera a colocação da luz contínua, que possui a maquiagem impecável e o cardigã mais charmoso do staff.

O teor documental indefectível dos arquivos fotográficos trazem ao olhar presente particularidades ligadas não apenas a texturas aparentes. A pose, esta sim, de modo crível nos entrega parte da discussão sobre mecanismos de ênfase na credibilidade da força da operária e na ilusão de que a fábrica era um território tênue com a linguagem da moda e da sedução. Desses movimentos inerentes aos acervos é possível estabelecer curvas interpretativas só possíveis pela produção imagética através da qual uma sociedade constrói seus símbolos (com causas e efeitos). Enfim, que o impacto do signo sempre nos jogue para o interior de suas camadas de razões e encenações.

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