Diógenes Moura

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pierre-verger-bahiaFoto: Pierre Verger

Nem me lembro da primeira vez que vi essa fotografia de Pierre Verger (Paris, 1902 – Salvador, 1996) feita no Carnaval de Salvador, na década de 1950, possivelmente no frontispício da Santa Casa de Misericórdia da Bahia. É uma imagem quase sagrada para mim, e existe como se nunca tivesse deixado de existir no meu inconsciente particular, na sala da minha casa.

Revive o auge da doçura no Carnaval de Salvador, hoje apenas material de consumo. Trás para a “boca de cena” uma figura tripla – homem/mulher/transexual numa elegância parada no tempo: as mãos, o cigarro, os olhos que insistimos em tentar ver por baixo da máscara de careta. Na fotografia não há ponto de fuga, mesmo quando deslocamos o olhar para a direita, onde está a figura do menino quase sorrindo, cujas palavras poderemos até ouvir: “Olha, aquele cara descobriu tudo!”.

É uma fotografia onde tudo dá certo, numa trilogia de olhares que se completa com o retrato de um candidato a Deputado Estadual na parte superior da imagem.

Em 2011 repeti a mesma roupa da figura mascarada para sair fantasiado na Mudança do Garcia, um bloco de protesto que desfila na segunda-feira. Ampliei a foto 60 cm x 60 cm, coloquei uma moldura barroca e escrevi na porta em vermelho: Com Quantos Carnavais se Apaga uma Memória? Éramos um personagem dentro do outro, com a foto nas mãos.

Quando o bloco estava chegando no Campo Grande, um folião se aproximou, leu e disse na sua oralidade baiana: “Para apagar uma memória basta uma rola”. Como não sou fotógrafo será um sonho impossível fazer uma imagem tão definitiva como esta. Fica aqui a minha homenagem e gratidão a Pierre Verger, que tão bem revelou nós mesmos com o que viu a partir dos seus olhos de Xangô.

 Diógenes Moura.

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