Albert Eckhout – Dança Tapuia
Se uma imagem vale mais do que mil palavras como dizem, vale ainda mais quando tal imagem transpõe de forma contundente um passado histórico e revela a formação do povo brasileiro. O ditado neste ponto sobrepõe-se à conotação do universo dos signos e de seus significados, tornando um documento estético de grande valor para a humanidade.
O pintor holandês Albert Eckhout, integrante da comitiva do governo de Maurício de Nassau, no período de 1637 a 1644, figura no mundo das artes como artífice em representar com precisão os exóticos nativos do Novo Mundo. Até o momento de sua estadia no Recife, cidade na qual permaneceu durante 7 anos, as imagens concebidas não eram condizentes com a realidade. A imaginação transvestia-se de surrealismos alegóricos e assim, a fantasia traçava o lado monstruoso de desconhecidas terras descobertas por intrépidos viajantes.
O mapeamento das etnias realizado por Albert Eckhout trata-se de uma preciosidade imensurável para o conhecimento da formação da identidade brasileira. Sua abordagem estabelece a altivez dos retratados, assim como imprime em cada quadro a autenticidade das diferenças culturais. Apenas por essas características (dentre tantas outras), Eckhout é onipotente em termos de pioneirismo em dominar a cena vivenciada, redimensionando-a através do vigor da pintura realística.
Albert Eckhout estabeleceu-se como um baluarte em seu ofício, ou seja, transmitir impressões sobre a gente que constituía o Brasil Holandês. Suas telas são exuberantes, tanto quanto parecia o Brasil ao olhar europeu. Seu estilo envolve o espectador numa espécie de túnel do tempo. As cores e os contrastes sugerem uma tridimensionalidade, como se as figuras retratadas viessem ao nosso encontro. As grandes proporções dos quadros invadem o espaço – ritmado pela magnitude de homens e mulheres, indígenas e mulatos, mamelucos e negros.
O acervo chegará ao Brasil, pela primeira vez completo, em setembro, com a mostra Retrato do Novo Mundo: o Legado de Albert Eckhout. E Recife terá a oportunidade singular de apreciar a parte mais importante e valiosa da produção desse artista: os retratos da gente do Brasil. A reunião das 26 telas a óleo faz com que um extraordinário mestre da pintura do período do Brasil colonial seja descoberto por outros olhares, que não de historiadores, pesquisadores e deleitantes da arte. Desse modo, o tesouro manufaturado por Albert Eckhout, pertencente ao Museu Nacional da Dinamarca, não deixa de ser imagens que falam pelo passado e pela idiossincrasia do olhar de um europeu desvelando a terra brasilis.
* Publicado no Jornal do Commercio em 19 de fevereiro de 2002.