Garapa

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Edward Hopper– Nighthawks, 1942

Por Paulo Fehlauer/Garapa.

A foto que eu gostaria de ter feito não é uma fotografia propriamente dita, ao menos não tecnicamente, mas duvido que alguém ousaria negar a Edward Hopper o status de fotógrafo. Ninguém observou melhor a solidão, o silêncio e a transitoriedade do que ele, que acabou por influenciar uma geração de fotógrafos que inclui grande parte das minhas maiores referências.

Há um certo desespero nas imagens de Hopper, é como se elas configurassem sempre uma grande reticência, um hiato tão cheio de significado que torna o próprio silêncio algo assustadoramente ensurdecedor.

John Cage disse em entrevista certa vez que, atualmente, nosso silêncio significa trânsito. Desligue todos os sons de sua casa e o que restará? Considerando uma vida urbana como a da maior parte de nós, é bem provável que permaneça em nossos ouvidos um burburinho constante de carros, motos, ônibus, aviões: complexas massas de metal retorcido, pintados e moldados com a finalidade de preencher de barulho o nosso silêncio, livrar-nos do tédio aterrorizante.

Some Hopper a Cage: uma madrugada, um bar de um hotel barato, nenhum som além do ambiente. Chuva do lado de fora, um viajante exausto a saborear lentamente o seu café. Do outro lado do salão, alguém o observa atentamente; curiosamente, cria para si um personagem, imagina suas ideias e questionamentos. Eis a foto.

Meu pai na autoescola nos anos 70, com o amigo segurando o espanador e ele ao telefone

Por Rodrigo Marcondes/Garapa.

Passei algum tempo – desde que conheço o “A foto que eu queria ter feito” – imaginando qual seria essa imagem para mim. Vários grandes fotógrafos e imagens me passaram pela cabeça, mas nunca conseguia pensar em uma opção definitiva.

Quando o Belém nos convidou para participar da seção, minha brincadeira íntima virou tarefa…

Lembrei então de uma imagem que faz parte de meu imaginário desde a infância. É uma foto na qual esta meu pai, ao telefone, ao lado de dois colegas de trabalho. Acho que foi feita lá pelo meio da década de 70. Uma imagem divertida, que sempre me fez mergulhar indiretamente na memória de meu pai. A foto está tão presente em minha própria memória, que posso facilmente me imaginar atrás da câmera no momento do clique. O colega do meu pai, exibindo o espanador, pose de caçador; meu velho (com a idade que tenho agora) ao telefone, o poster da mulher – quem é a mulher? – ao fundo. Seguramente essa é a foto que eu queria ter feito!

Foto: João Castilho

Por Leo Caobelli/Garapa.

Quando o convite chegou para indicarmos as fotos que queríamos ter feito, pensei direto nessa imagem. Ela não é exatamente o que queria ter feito, mas de alguma forma o que fiz.

Na introdução do Poética do Espaço, do Bachelard, tem um momento que ele fala em poesia escrita que caberia muito para eu justificar essa afirmação. Trocando os termos: “Na ressonância vemos uma imagem; na repercussão a enxergamos, ela é nossa. A repercussão opera uma inversão do ser. Parece que o ser do fotógrafo é o nosso ser. A multiplicidade de ressonâncias sai da unidade de ser da repercussão. [… ] Essa imagem torna-se realmente nossa. Enraíza-se em nós mesmos.”

Quando estava em Brasília com outro Leo, o Wen, tiramos uma tarde pra ir no Poço Azul, uma cachoeira depois das cidades satélite. No caminho, a estrada de terra vermelha e amarela ia alternando até que, numa descida cheia de curvas, um redemoinho pequeno apareceu levantando o vermelho… depois da curva tinha um maior que ficou dançando um tempo na frente do carro. Os dois pensaram em pegar a camera… não pegamos, o redemuinho desapareceu:

– Sabe no que eu pensei, Wen?

– Quê?

– No redemunho do Castilho…

– Exatamente… eu tb!

Quando a coisa repercute desse jeito, de enraizar mesmo, ela é nossa. Não é estritamente o “queria ter feito” – passa a ser o “já fiz”, por recebê-la assim do outro. Esse paralelo com o som que Bachelard criou dá essa magnitude; enquanto tem coisas que nos são lindas e ressonam na gente, isso causa uma trepidação, uma inquietude – com certeza – mas a coisa que repercute é terremoto mesmo.

Foto: David Barreto

Por Gabi Barreto/Garapa.

São muitas as fotos que eu queria ter feito, não preciso nem citar gênios da fotografia para convencê-los disso. Mas depois de muito quebrar a cabeça, resolvi escolher um caminho mais fácil pra mim e fico com uma foto que meu avô fez da filha dele, a minha tia Márcia, pouco antes de ela vir a falecer.

Meu avô é o grande responsável pelo meu interesse pela fotografia, pois foi com ele que aprendi os princípios básicos e foi com a câmera dele que comecei a fotografar.

Essa foto é marcante por diversos motivos, um deles é o de que minha avó, quando se separou do meu avô, num ato misto de paixão e ódio rasgou e jogou fora todas as fotos em que meu avô aparecia, ou que ele havia fotografado. Isso fez com que minha mãe e tios tenham hoje no máximo umas 20 fotos da infância e juventude deles. Da tia Márcia mesmo, a única foto que já vi é essa aqui,que foi ampliada num tamanho gigantesco e está pendurada na parede da casa da minha vó até hoje.

Outro motivo para essa foto ser marcante é que durante minha infância minha vó insistia em dizer para todo mundo que desconfiava que eu era uma espécie de reencarnação da tia Márcia. Ao mesmo tempo que isso me deixava completamente assustada, me deixava curiosa em tentar descobrir como era essa tal tia Márcia que eu nunca conheci e que teoricamente, pelo menos pra minha vó, tinha tanto em comum comigo.

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