Incômodo. Fustigação. Crítica. Assim, bem assim o ensaio Consuming Kids, do argentino Nico Silberfaden, enreda nosso olhar. As cores vibrantes são o espetáculo. As crianças – alegres e realizadas – outro espetáculo da felicidade efêmera do consumo. Não, não entendam que crianças não devam ganhar seus brinquedos. O cerne da questão aqui é alimentar a reflexão sobre a sociedade e a onipresença do consumo. Difícil não pensar na prioridade em adquirir, no sentimento de dependência e ansiedade pelo desejo que não parece ter fim.
O trabalho de Silberfaden, muito embora tenhamos consciência desse sistema que nos “engole”, é translúcido em percorrer cenários e colocá-los de forma sutil. O teor comportamental em Consuming Kids prolonga a nossa percepção crítica sobre outro ponto a considerar: por que não vemos o que nos cerca? Sim, porque vivenciamos e, em alguns casos, partilhamos do exagero, do consumo fútil… Bom pensarmos sobre a imagem que um outro olhar nos propõe. A desarticulação da superficialidade com que cotidianamente apreendemos o universo imagético é um fator relevante. A priori todos sabemos. Mas, todavia, não vemos.
Nico Silberfaden apresenta crianças, cujas identidades respiram a extensão das coisas, dos objetos escolhidos. A dinâmica nonsense alarga os significados dos valores materiais. Gestos e situações geram os símbolos da rede social que toca a todos nós. Os espaços registrados por Nico sublinham a atmosfera de espetáculo, do encanto que depois se perde pelo chão com pais exaustos, abatidos. O filósofo Guy Debord, em sua obra A sociedade do espetáculo, já aludia: “O espetáculo é o momento em que a mercadoria ocupou totalmente a vida social.Não apenas a relação com a mercadoria é visível, mas não se consegue ver nada além dela: o mundo que se vê é o seu mundo”. O que dizer mais?
Por Georgia Quintas
* Texto originalmente publicado em 2010 no Fórum Virtual, blog do Fórum Latino-americano de Fotografia de São Paulo.