Convivendo com Eckhout

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Albert Eckhout – Mameluca

Meu encanto pela arte do pintor holandês Albert Eckhout está impressa na memória já faz um bom tempo. Tempo este que apesar de esmaecido, me remete a lembranças afetivas e influências intelectuais do meu avô, professor Amaro Quintas. Em qualquer ocasião e, principalmente, em datas festivas o presente era sempre o mesmo: livros. E assim, acompanhando a idade da menina e da jovem, chegavam os livros sempre com algum prólogo de viva voz para a conscientização da importância da leitura das obras presenteadas.  Desta maneira, segurei em minhas mãos o precioso livro de Clarival do Prado Valladares e Luiz Emygdio de Mello Filho,  Albert Eckhout – A presença da Holanda no Brasil, século XVII. Desde então, Eckhout tornou-se, primeiramente objeto de embevecimento estético, e por conseguinte  em objeto de investigação no campo acadêmico.

Após dois anos de intensa pesquisa sobre o legado de Albert Eckhout para a minha dissertação de mestrado em Antropologia, pela Universidade Federal de Pernambuco, fui surpreendida com a confirmação da grandiosa exposição do acervo pictórico eckhoutiano que se realizará no Recife, em setembro. Depois de três séculos, veremos o retorno das obras de Albert Eckhout à cultura que o acolheu e o inspirou.

Coincidências acontecem, de fato. Justamente quando coloco um ponto final em minha redação com uma profunda sensação de dever cumprido e sonho realizado, tomo conhecimento de que a magnificência da produção de Eckhout poderá ser contemplada pela população pernambucana na mais completa mostra de pintura deste artista do período da presença holandesa no nordeste brasileiro (1630-1654).

Ao terminar minha especialização em História da Arte, visitei a 24ª Bienal de São Paulo (1998) e deparei-me no núcleo histórico Antropofagia e histórias de canibalismos com alguns dos retratos da gente do Brasil de Albert Eckhout. No mesmo instante, pensei que ainda iria pesquisar o universo artístico interligado à concepção antropológica inerente ao trabalho eckhoutiano. E dessa maneira,  cheguei aonde estou, prestes a defender uma dissertação sobre Albert Eckhout. 

Ao conviver durante algum tempo estudando a obra eckhoutiana, tornou-se evidente a premência cultural que o repertório iconográfico dos artistas europeus viajantes  em terra brasileira traz à lume para as  Ciências Sociais.  No entanto, a pesquisa concentra uma  ínfima parte no campo inesgotável do conhecimento. Contudo, são as pequenas admirações que fomentam o pensamento, acrescentando-se assim considerações e reflexões a trabalhos já existentes, numa espécie de árduo processo de aprofundamento do objeto em comum enfocado. Por tudo isso, a vinda da exposição de Eckhout culmina  com o meu projeto enquanto pesquisa e prazos acadêmicos, mas jamais como o derradeiro ponto final de um texto. E sim, como um renovar sublime da estética e seus registros perante a vida.

* Publicado no Jornal do Commercio em 14 de março de 2002.

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