Mundos transfigurados

Comentários 7

Foto: Eder Chiodetto

Palestra de João Castilho no deVERcidade

Por Georgia Quintas.

No deVERCidade, a palestra do fotógrafo João Castilho foi uma viagem a mundos transfigurados. A cada ensaio que Castilho apresentava, envolto em sua fala suave, adentrávamos na profundeza que uma linguagem fotográfica revela quando experimentada e pensada. O silêncio da sala escura nos remetia à dialética de imaginários, de espaços limítrofes entre o crível e o surreal. As paisagens, as pessoas e os objetos são tão improváveis que criam vertigens ao nosso olhar.

A produção de Castilho revela-se das mais instigantes no campo da fotografia experimental. De tão profusa e profícua, torna-se flácido conceituá-lo. Documental imaginário foi uma definição apropriada por ocasião do trabalho Paisagem Submersa (realizado com Pedro David e Pedro Motta). E, de fato, João Castilho insere-se cada vez mais na abstração, na subjetividade e na construção da imagem como narrativa esgarçada. A inquietação dos mundos criados por Castilho precede o ato fotográfico. Inicia-se no pensamento, no rico repertório que o alimenta seja da literatura, do cinema ou das artes visuais. As fotografias são o resultado de pesquisas, de referências vitais para sua criação. Talvez, por isso não nos admira que Castilho coloque em sua palestra, por duas vezes, o poeta João Cabral de Melo Neto a nos declamar. O por quê?  Palavra enquanto discurso imagético. É, pode ser…

Mas, a intensidade e complexidade da obra de Castilho se amálgama também a Ernesto Neto – mestre em escultura e instalações – e ao artista Gordon Matta-Clark. Porém, a relação com a intervenção no meio ambiente como em “Tempero” ou “Linhas” tem uma forte ligação com a land art. O que nos faz lembrar de grandes nomes como Richard Long, Robert Smithson ou mesmo Nancy Holt e Dennis Oppenheim. Lembrou-me ainda, Ger Dekkers e Mac Adams. Castilho traz nos últimos ensaios o deslocamento do objeto para a sublimação da ideia.  Daí, o meio se coloca como esforço em suplantar o quadrante da câmera. A fotografia é redefinida como canal de subversão do mundo visível. As imagens evocam questões refinadas postas por sua fotografia conceitual. Como ele próprio fala: “A arte se alimenta da arte. É uma forma de trazer algo novo”.

Vimos a cadência dos ensaios de João, sempre com um hiato de que precisamos ver pausadamente suas imagens, para assim enxergá-las mais profundamente. Estavam lá, os mundos contorcidos pela imaginação em: Redemunho (2006), Lote Vago (2007), Marie Jeanne (2007), Tempero (2009), Peso Morto (2010) e Metamorfose (2010). Observamos ainda que a maior beleza da arte de João Castilho é sua busca deliberada em pesquisar para se chegar ao ponto das belas incertezas (como faz) do que das pífias verdades.

Para mim, estar na apresentação de Castilho foi entender o lugar da obra que transborda em teias de ideias, de emaranhados simbólicos… A intensidade de sua poética está na atmosfera flutuante do que supomos saber sobre temas tão profundos como identidade, lugar, não-lugar, corpo, pertencimento, alegoria do tempo, das palavras. Como declamou João Cabral de Melo Neto, “uma pedra de nascença entranha na alma”.  Parece ser assim que Castilho vive sua arte. E para entender toda essa digressão sobre Castilho, só vendo o que vimos.

Fotos: João Castilho

Temperos, 2009

Linhas, 2009

Linhas, 2009

João Castilho no Olhavê: Entrevistando e Processo de criação 1 e 2.

Comentários 7

Deixe um comentário