A seção Processo de criação traz o relato do artista pernambucano Bruno Vilela. Bruno acabou de produzir uma nova obra que se chama “A Princesa e a ervilha”. Seguindo a linha do seu ensaio “Bibbdi Bobbdi Boo” (2008), Bruno estará expondo esta foto na SP Arte.
Bruno está no Perspectiva e no Olhavê.
Foto: Bruno Vilela
A Princesa e a ervilha
10 colchões de casal, 16 edredons, maquiagem verde, esmalte verde, tinta de cabelo verde, um lustre alugado num antiquário, uma autorização que demora 15 dias para entrar numa mata num terreno da prefeitura, câmera, tripé, uma maquiadora e uma linda modelo.
Produção de cinema para um click.
É foto de agricultor como diria Jeff Wall.
Uma semana de produção para um click, o momento mágico.
“A princesa e a ervilha” é um conto dinamarquês de 1835. Relata a história de um príncipe que desejava casar com uma princesa. Em certa noite de muita tempestade, bateu à porta do castelo uma moça, dizendo-se uma verdadeira princesa. Para testar se a moça falava a verdade, a rainha a convidou para dormir no castelo. Antes, porém, colocou uma ervilha na cama em que a moça iria dormir e, por cima, vários colchões e cobertas. No dia seguinte, ao perguntar à moça como ela tinha passado a noite, recebeu como resposta que a noite tinha sido péssima, porque alguma coisa a havia machucado. Com esta resposta, a jovem comprovou ser um verdadeira princesa, pois somente uma verdadeira princesa poderia ter a pele tão sensível, e casou com o príncipe.
Na minha desconstrução do conto, a ervilha germina na base dos colchões, fura todos eles e penetra no corpo da branca princesa, que de tão branca é possuída e fica verde. Depois da cópula com a “entidade ervilha”, ela dorme tranquila nos colchões. Dorme tanto que o castelo se desfaz e só sobra a mata, o candelabro ao topo e os inúmeros edredons.
Todo esse conceito vêem a baixo quando minha motivação principal é visual, a foto nada mais é que uma pintura, visto que sou pintor de formação, um encadeamento colorido de tecidos com uma figura humana que se funde aos edredons pela cor e um enquadramento que eleva o espírito.
A foto é comprida, como uma catedral gótica ela nos leva para o alto. Uma referência ao filme “O Sacrifício” de Andrey Tarkovsky, na cena onde um casal levita com lençóis, aqui a princesa parece levitar e com ela leva as camadas de cor junto.
Arte é xamanísmo, um portal para outra dimensão, como diria o mestre Beuys e Da Vinci. É cor, forma, composição, espiritualidade, matéria e o tesão pelo visual como fez o mestre Rauchemberg. Sim, é uma fotografia, mas tem muitas outras camadas, como as dos colchões, por traz disso tudo.
Bruno Vilela.
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