Anderson Schneider

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A quarta participação na série “Processo de criação” é do fotógrafo Anderson Schneider. Anderson está com um projeto em andamento que foi aprovado pela Funarte. O título é Brasília Concreta, e trata da cidade que acolheu o fotógrafo. Anderson já nos presenteia com imagens de uma Brasília que está prestes a completar 50 anos e se revela não tão concreta assim.

Site de Anderson Schneider, aqui.

Entrevista com Anderson Schneider (em outubrode 2008) na seção Entrevistando…, aqui.

Cia de Foto, Rodrigo Braga e João Castilho na seção “Processo de criação”, aqui.


OLHA, VÊ Sobre o tema, “Brasília Concreta”, gostaria de saber sobre a escolha e as motivações para desenvolver o tema.

ANDERSON SCHNEIDER Bom, acredito que Brasília tenha a peculiar condição de ser famosa mundialmente e, ao mesmo tempo, desconhecida até mesmo de seus habitantes. É uma cidade cartão-postal. Isso é, em grande parte, fruto de seu desenho urbano e da utopia modernista da época de sua concepção. Acontece que o tempo passou e a cidade continua aí, ou melhor dizendo, aqui. Sempre tive a vontade de fazer um retrato da cidade real e contrapô-lo à idéia de cidade inventada – creio que a oportunidade surgiu agora com essa Bolsa.

Para resumir então, o projeto trata-se de um documentário. Um retrato da atmosfera, do imaginário de uma jovem cidade que não é mais o que fora desenhada para ser e que busca, obcecadamente, explicação para o espanto de sua própria criação. Vejo-o como um ensaio de sondagem psicológica do que vive não na Brasília sonhada, mas na Brasília insone, um retrato dos homens e de suas sombras, da imperfeita perfeição de uma cidade que, às vésperas de seu cinquentenário, vive às voltas com os prazeres e decepções do amadurecimento.

OLHA, VÊ Qual a relação entre esse novo projeto e o seu ensaio “Invented City”?

ANDERSON SCHNEIDER Antes de mais nada, Invented City é apenas o nome provisório de um ensaio postado na versão inglesa de meu website. Tudo bem, meu website não tem versão em português, mas isso já é outra conversa… Bom, voltando ao assunto: Cidade Inventada é um recorte da arquitetura de Brasília desenhada por Niemeyer. Só para contextualizar, ele foi feito em uma semana e sob encomenda para um jornal, por ocasião do centenário do arquiteto. É um projeto que ainda tem um pé no que Brasília fora planejada para ser. Porém, apesar de ser um trabalho restrito e focado primariamente em alguns edifícios da cidade, acho que nele já são visíveis alguns pontos que viriam a ser, mais tarde, o objeto de estudo do Brasília Concreta.

Já o Brasília Concreta expande e assume a linha de pesquisa iniciada no ensaio anterior, concentrando esforços na exploração dos atores e da atmosfera da cidade, ou seja, na busca de um desenho do inconsciente dela. Esse ensaio já está muito mais direcionado para o que o Brasília veio a se tornar.

Fica agora claro para mim, escrevendo esse texto, que um não existe um sem o outro; são duas metades de uma mesma coisa.

OLHA, VÊ O processo de criação será como? Uma criação linear ou que se desenvolve de acordo com os resultados?

ANDERSON SCHNEIDER Um pouco dos dois, eu acho. Não acredito em trabalhos que se desenvolvem apenas de acordo com os resultados, sem uma idéia inicial organizando a busca. Geralmente quando não tenho um bom motivo para segurar a câmera, prefiro ficar em casa brincando com a minha filha. Não sou do time que enxerga um lado lúdico na fotografia. Contudo, também não acredito em trabalhos que terminam no ponto onde foram desenhados para acabar. Quando isso acontece, não me sinto diante de fotografia, mas sim de um exercício estético (ou até mesmo artístico) que usa a fotografia apenas como uma (limitada) técnica.

Para que a fotografia exista, acredito que a interferência da realidade deva ser, fundamentalmente, o núcleo do trabalho. Fora disso, tudo é apenas arte eletrônica ruim.

OLHA, VÊ Qual a situação atual do projeto?

ANDERSON SCHNEIDER Está no meio do caminho. Quis tanto ir atrás dos becos de Brasília que agora estou preso em alguns deles.

OLHA, VÊ Os objetivos estão preestabelecidos ou não?

ANDERSON SCHNEIDER Complicado responder. Diria que os objetivos que tratam do que procurar, de maneira geral, já estão, sim, preestabelecidos. Já o que será encontrado, tomara que não…. Mostro aqui algumas das imagens já feitas, mas o faço muito mais a título de ilustração da entrevista do que de uma apresentação do trabalho. A narrativa ainda está muito incompleta.

 

OLHA, VÊ Sobre técnica fotográfica/produção/estética. Como você irá realizar as fotos? Você já pensa em algo para mostrar como resultado: exposição, catálogo, etc.

ANDERSON SCHNEIDER Com a câmera que tiver, com a luz que encontrar e com todos os detalhes que conseguir tirar de meu quadro. Detalhes complicam tudo…

Pretendo, sim, transformar o trabalho em uma exposição, mas por enquanto pretender é a palavra. Se virar exposição, vira também (tomara) catálogo e internet. Imagino também que parte do material terá algum uso no aniversário de 50 anos da cidade, a ser comemorado em 2010. Mas tudo, claro, vai depender de como o trabalho caminhará até lá. Torço pelo melhor.

OLHA, VÊ Sem dúvida, “Brasília Concreta” tem a ver com a sua relação com o lugar em que vive. Como isso influencia o trabalho fotográfico?

ANDERSON SCHNEIDER Na verdade, viver aqui me fez querer tocar esse trabalho – é o que devo à cidade que me acolhe. Mas, fora essa vontade inicial (e, claro, a disponibilidade de tempo para investir nessa exploração), não vejo muita diferença entre tocar essa história aqui ou em outra cidade. Eu sou outra pessoa quando fotografo, ou melhor, acho que não sou pessoa alguma.

OLHA, VÊ Como você irá abordar a temática humana em um tema que poderá (ou poderia) ser árido, tomando por base o nome “Brasília Concreta”?

ANDERSON SCHNEIDER Pois é, o termo concreto é legal porque pode tanto adquirir características de substantivo e se referir ao concreto-armado, tão árido e presente na cidade, quanto também pode adquirir características adjetivas e se referir à Brasília de verdade, à cidade viva e real que pulsa sob o edificado. Gosto muito dessa dialética de sangue e cimento e procuro nesse trabalho vislumbrar o equilíbrio desses opostos, de que maneira eles interagem e se influenciam para que a cidade possa realmente existir.

Lembra da imagem do cartão-postal? Pois então, o projeto tenta explorar o verso dele. É lá que estão todas as palavras de afeto e saudade escritas em letra apressada, os selos colados tortos e os carimbos apagados dos correios, enfim, as coisas que transformam um simples pedaço de papel pintado em um objeto quase vivo.

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