Joel-Peter Witkin

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Fotos: Christina Rufatto/Itaú Cultural

Palestra de Joel-Peter Witkin

Joel-Peter Witkin: Dissecação da anatomia de um olhar

Por Georgia Quintas, São Paulo 

Generosidade. Antes mesmo da palestra, no sábado pela manhã, todos estavam impressionados com o vigor e a generosidade de um dos mais importantes autores da história da fotografia, o americano Joel-Peter Witkin, 70 anos. Fez leitura de portfólio com invejável disposição e gentileza. Começou às 9h e foi até as 17h, sem interrupção para almoço. Se envolveu com cada portfólio durante 30 a 40 minutos.

Detalhes que prenunciavam seu Relato para uma platéia reduzida por conta do auditório. A fila que se formara, desde muito cedo, denunciava que ouvir o ícone seria, de certo, uma oportunidade rara. Dessas que você não acredita ser real.

Após a leitura, feita por Eder Chiodetto, de um breve currículo feito de próprio punho por Witkin, a nossa experiência se inicia. A atmosfera sombria, dramática, pungente e bizarra de Witkin se plasma em suas imagens. O homem do campo, como ele mesmo se apresenta, é iluminado e pragmático. Fez uma edição valiosa de sua trajetória. Vimos a versão do autor sobre as suas mais significativas obras. Era a criação do fotógrafo e sua vida contada pelas imagens.

O lindo som seco do projetor de slides marcava cada análise de imagem. Sim, slides com reproduções de seus trabalhos. Witkin é deliciosamente detalhista. Explicou, literalmente, todo o processo de composição de cada fotografia: idéia, produção, dificuldades de execução, resoluções estéticas. Paradoxalmente, o mundo exótico de Witkin é real e matérico, não sofrendo nenhum tipo de manipulação. Mas, algo o incomodou. Apontou na imagem e disse: “É uma sujeira no slide…”

Sua apresentação teve algumas pérolas. Começou com uma fotografia quando tinha 11 anos de idade. Nos mostra a primeira foto de sua graduação. Segue-se, a partir de então, o misterioso mundo mágico de Witkin. São histórias surpreendentes, diria fortes em algumas delas, em contrapondo com a atmosfera prosaica que ele denota em seu discurso. De maneira que percebemos uma desconstrução de universos criados com muito estudo e acuidade visual. O estranho é uma trilha que nos impulsiona para a invenção única de uma percepção genial a respeito da autonomia poética da fotografia.

Se tudo é muito irreal, incrivelmente maneirista e alegórico, Witkin deixa cristalino que trata-de do “mistério da representação” e que sua criação parte de um conflito entre o divino e o bestial. Infelizmente, sua fala foi centrada na análise da composição, numa espécie de dissecamento de seu olhar e suas intenções. Não aprofundou, em nenhum momento, uma reflexão conceitual de suas temáticas ou de suas escolhas. Afinal, resolvemos imagens porque todo fotógrafo é por natureza alguém que necessita expor pensamentos, idéias ou questionamentos. Ficou um hiato. Não houve interpretação das imagens, nem desencadeamentos poéticos do seu mundo inventado.

Talvez, se aprofundasse passagens que dizia acreditar na fotografia como artífice de metáforas do mundo realista, numa tentativa de entender a vida, alguns aspectos de obra emergissem. Disse que seus trabalhos refletem sua busca dual entre infinito e finito, homem e deus.

Witkin é pura consciência. A acuidade visual e o vasto conhecimento que possui da história da arte se reflete em suas histórias criadas. Diria que são improváveis parábolas que nos impressionam pela originalidade do mundo que contemplamos.

Suaves e sutis não são adjetivos que podemos ligar ao léxico dos personagens de Witkin. Fragmentos de corpo humano e as aventuras em necrotérios e institutos de medicina legal perfazem seu discurso. O mais interessante é que já não nos “apavora”, pois tudo é explicado de modo muito simples e tranqüilo. Bom mesmo foi vê-lo falar, falar… E depois dizer: “Adoro isso, é muito bom”, soltando uma juvenil risada.

Já me alonguei e não repassei metade das minhas anotações. Só posso referendar Edward Steichen, quando viu naquele garoto de 16 anos um jovem talento. É, ele estava certo.

 

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