Por Georgia Quintas.
A ideia – ou melhor, a demanda pautada – era fazer uma reportagem para a revista Fortune, em 1936. O lugar: o Alabama, cruento pela Grande depressão americana. Mais uma cobertura, não fosse pela dupla envolvida (poderia ser apenas o hábito do olhar e do escrever): o fotógrafo Walker Evans e o escritor James Agee.
Evans é um clássico precioso da fotografia mundial. Pungente, diverso, criativo e sugestivo. A última exposição realizada, no ano passado em São Paulo, compilou o vigor de sua carreira. Vale contemplar pequenas pérolas que são suas Polaroids urbanas, saturadas, repletas de placas e fachadas. Muitas das lendárias fotografias de Walker Evans, conhecido por ter feito parte da trupe de fotógrafos agenciados pelo governo federal americano (Farm Security Administration), foram realizadas neste período.
Pois bem, os dois conviveram algumas semanas e foram sensíveis demais à toda aspereza da dor testemunhada. Seguiram caminhos empoeirados e foram encontrando – imersos no isolamento da pobreza e da falta de perspectiva – três famílias de meeiros. A pauta tornou-se vivência mal curada, conseguiram descrever por imagens e verbo tudo que passaram. Por fim, a matéria nunca fora publicada. A revista recusou por considerar que não se “encaixava”. Após cinco anos, a história foi publicada e o livro (Elogiemos os Homens Ilustres. São Paulo: Companhia das Letras, 2009) tornou-se um marco para a reflexão da objetividade da fotografia e do texto jornalísticos. Esse clássico do jornalismo literário (pontuado pela ficção), é precioso pelo que Walker Evans escreve e nos mostra, pelo desconcertante estilo de Agee e pela parceria fraterna dos dois.
A biógrafa de Walker Evans, Belinda Rathbone, constata que o livro revela “uma reflexão sobre o limite das palavras e o perigo da fotografia, uma relação das viagens de Agee e Evans pelo sul em busca pelo assunto, uma confissão de impotência quando se viram diante desse assunto (…)”. O livro é um labirinto de grandes questões sobre fotografia e o momento de colocá-la entre as pessoas, como intermediadora, confissão, complacência e doação – entre ambas as partes: fotógrafo e fotografado.
Observem o que coloca James Agee no prefácio: “As fotografias não são ilustrativas. Elas, e o texto, são coiguais, mutuamente independentes e plenamente colaborativos. Por sua raridade, e pela impotência do olho do leitor, este fato não será compreendido pela maior parte daquela minoria que não ignorar de todo. No interesse, contudo, da história e do futuro da fotografia, esse risco parece irrelevantem e necessária essa clara afirmação”.
Para mim, valeu a pena passar por essa experiência de leitura.
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